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Foto do escritorSaulo César Paulino e Silva

Campo Grande em Memórias - Crônica

Atualizado: 6 de jan. de 2022




Amanheceu!


Era um dia de festa, pois chegara o momento da viagem esperada, quando se iniciavam as férias escolares.

Eram tempos em que a escola pública nos obrigava a usar uniforme composto de calça cinza, camisa branca com o brasão de armas costurado no bolso. Me recordo, ainda, que essa obrigação se estendia a uma formação militaresca, no pátio, diante de uma bandeira que pouco significava para nós crianças, ao som de um Hino com frases incompreensíveis sobre heróis desconhecidos.

Esse era o Brasil das gerações órfãs da liberdade de escolha, mergulhado no medo endêmico de um “inimigo vermelho oculto”, que diziam devorar os filhos dos filhos, dos filhos da “Pátria Amada”.

Nesse cenário ignorado, tínhamos no futebol a alegria das disputas acirradas, em campos improvisados em ruas de terra, nas competições do jogo de bolinhas de gude, ou ainda, na correria para fazer subir as “pipas” contra o vento, colorindo o céu de nossas vivências.

Esse pequeno mundo encantado, agora, seria transportado temporariamente para a casa de minha Avó Florisia, que morava no Rio de Janeiro. Essa era a oportunidade para rever primos, tias, e amigos queridos, que fizeram parte da construção de minhas fragmentadas identidades.

Nos idos dos anos sessenta e início dos setenta, a viagem para o Rio de Janeiro poderia ser realizada por dois meios. Pelo “Trem de Prata”, que saia todos os dias logo cedo da Estação da Luz, ou por meio de ônibus, que as três empresas rodoviárias principais ofereciam. Eram elas: a Cometa, a Expresso Brasileiro e a Única (mais tarde vendida para a Itapemerim, que passou a fazer o trecho São Paulo - Rio). Não custa lembrar, que as viagens por avião eram praticamente impossíveis para as classes mais simples e, por isso, nem foram cogitadas neste relato!

Quando íamos de ônibus, pela via Dutra, antes de chegar à rodoviária fluminense, descíamos em uma localidade chamada “Belvedere Viúva Graça”, para pegar um ônibus urbano, cuja empresa se chamava “Ponte Coberta”, com destino ao distante bairro de Campo Grande, então, estado da Guanabara. Aliás, uma curiosidade, sempre simpatizei com esse nome “Ponte Coberta”, porém nunca soube o seu real significado!

Quando íamos de trem, o barulho do atrito das rodas de ferro sobre os trilhos, presos aos dormentes de madeira, embalavam animadamente esse universo, sugerindo uma canção natural, sem autoria, e que, por meio de uma onomatopeia, pareciam dizer “pracasadevovó... pracasadevovó... pracasadevovó... pracasadevovó...

Quando chegávamos, éramos recebidos de maneira eufórica e amável por todos e todas. Abraços, sorrisos, conversas comuns, de pessoas comuns, em um lugar comum, de gente humilde e trabalhadora.

A casa tinha duas janelas frontais, com os vidros pelo lado de fora, abrindo-se de par em par. Apresentava também uma porta na lateral direita, acompanhada de uma outra janela, após uma breve escada, entre outras particularidades. Certa vez, fiz um exercício de regressão temporal, em que revisitei essa casa e, posteriormente, detalhei o seu interior em um desenho artesanal e que ao final deste relato irei compartilhar.

O imóvel se localizava, na Estrada das Capoeiras, no antigo 166, comprado, provavelmente, ainda nos finais do século XIX. Fora construído em um amplo terreno com mangueiras, goiabeiras, cana e outras árvores, que não me recordo, além das criações de galinha entre outras.

Ali eu passava os dias, em meio a aventuras cotidianas, com os brinquedos de estimação na terra preta do chão, sentindo o cheiro característico do lugar e das pessoas, que ainda percebo no olfato da memória.

Essa Estrada cortava sítios e fazendas, sendo margeada por árvores centenárias. Em sua imensidão desconhecida, então para mim , era pontuada pelos poucos ônibus que circulavam; parecendo sumir ao longe como um risco escuro a se perder no horizonte.

Esses foram dias de um tempo que se repetiu durante anos, e ficou marcado pela felicidade de uma existência! Agradeço à vida pela oportunidade de hoje compartilhar essas experiências com aqueles e aquelas que, assim como eu, amam o lugar onde nasceram e se constituíram como pessoas.

Em homenagem a Campo Grande, ainda na Juventude, compus uma música com o nome do bairro, e que gostaria de compartilhar com vocês.


Espero em breve, reencontrá-los para mais histórias e lembranças.





 


CAMPO GRANDE



Letra da música em homenagem ao bairro.


Sol, terra, montanha,

Pessoas amigas, pessoas queridas,

Amigos, amigos.

Rio de Janeiro, Itaguai,

Campo Grande, Muriqui.

Rio de Janeiro, Icarai,

Campo Grande, Parati.

Sol, terra, montanha,

Pessoas pessoa amigas queridas,

Amigos, amigos.

Rio de Janeiro, Itaguai,

Campo Grande, Muriqui.

Rio de Janeiro, Icarai,

Campo Grande, Parati.









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